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sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

La Rêveuse

domingo, 20 de outubro de 2013

As pessoas instantâneas
























Quando a morte cai sobre as pessoas
é porque tem as asas cansadas
de dar voltas ao mundo.

Escolhe, hesitante, um dos seus cantores.
Escolhe quem, matinalmente, se cumprimenta.

A morte um dia esquece e desce
sobre os mesmos reverentes.

Esqueceu tudo o que dissera.
Ou fingiu que esqueceu tudo.

Alguém parou misteriosamente de falar.

E o silêncio quer dizer: “Acabou tudo.”
Quer dizer: “venham comigo até aquelas grutas!”

Agora finjam que estão velhos.
E que ninguém está nada triste.

Olhem para as vossas pernas,
não há pernas!

Nem mãos,
excepto para tocar em coisas indescritíveis.

As crianças que morriam.

Vou viver para a neve com os meus filhos
mergulhar nos rios soturnos e profundos
em segundos.

Por entre as algas e os peixes que prendiam
os braços das crianças que agarravam
os polvos misteriosos que ensinavam
a nadar os que mereciam.
Se a mim viesse algum dos mortos que ensinasse
a morrer a quem vivesse
a nadar a quem andasse
a dormir a quem falasse

Sem parar.

Imitaria a vida que vivesse
esse monstro que ensinasse

Que morresse.

Que matasse.

Sem matar.


António Ladeira

sábado, 31 de agosto de 2013

Uns, com os olhos postos passado...

Uns, com os olhos postos no passado,
Vêem o que não vêem; outros, fitos
Os mesmos olhos no futuro, vêem
O que não pode ver-se.

Por que tão longe ir pôr o que está perto-
A segurança nossa? Este é o dia,
Esta é a hora, este o momento, isto
É quem somos, e é tudo.

Perene flui a interminável hora
Que nos confessa nulos. No mesmo hausto
Em que vivemos, morreremos. Colhe
O dia, porque és ele.


Odes de Ricardo Reis, Fernando Pessoa

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Atrás dos Tempos Outros Tempos Vêm...

Ilustração da Divina Comédia, Códice Urbinate Latino



















Atrás dos Tempos Outros Tempos Vêm by Fausto on Grooveshark

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Sem causa...


Sem causa a Infância ri, sem causa chora:
Incauta se despenha a mocidade;
Sacode o jugo, e nela a liberdade,
A caça, o jogo, o amor, tudo a namora.

Das honras o varão se condecora;
Tudo é nele ilusão, tudo vaidade:
Junta Tesouros a avarenta idade;
Diz mal do nosso, e ao tempo andando adora.

Tormento é toda a vida, é toda enganos:
Quando uns afectos vence a novos corre,
E tarde reconhece os próprios danos:

Porque enfim se a prudência nos socorre,
Ditada na lição de longos anos,
Quando se sabe, então é que se morre.


Paulino António Cabral, Abade de Jazente (1719-1789)

Frank Scherschel, 1946

sexta-feira, 22 de março de 2013

Alegoria

V. Quem chama dentro em mi? - T. O tempo ousado.
V. Entraste sem licença? - T. Tenho-a há muito.
V. Que me queres? - T. Que me ouças. - V. Já te escuto.
T. Prometes de me crer? - V. Fala avisado.

T. Errada vás. - V. Também tu vás errado.
T. Essa é condição minha. - V. Esse é meu fruto.
T. Tu és mulher descuidada. - V. És velho astuto.
T. Erro sem dano meu. - V. Assás tens dado.

T. Ai, vida como passas? - V. Perseguida.
T. De quem? - V. De ti. - T. O Tempo o gosto nega.
V. O tempo é ar. - T. A Vida é passatempo.

V. Tu já nem Tempo és. - T. Nem tu és já Vida.
V. Vai para louco. - T. Vai-te para cega.
- Vedes como se vão a Vida e o Tempo?


D. Francisco Manuel de Melo (1608-1666)

Edward Steichen, 1925

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Prelúdio de uma Primavera Triste

O sol é grande, caem co' a calma as aves,
do tempo em tal sazão, que sói ser fria;
esta água que d' alto cai acordar-m'-ia
do sono não, mas de cuidados graves.

Ó cousas, todas vãs, todas mudaves,
qual é tal coração qu' em vós confia?
Passam os tempos, vai dia trás dia,
incertos muito mais que ao vento as naves.

Eu vira já aqui sombras, vira flores,
vi tantas águas, vi tanta verdura,
as aves todas cantavam d' amores.

Tudo é seco e mudo; e, de mestura,
também mudando-m' eu fiz doutras cores:
e tudo o mais renova, isto é sem cura!


Sá de Miranda

Prelúdio de uma Primavera Triste - Margaret Mather, de Edward Weston, 1920

sábado, 19 de janeiro de 2013

O Estudante Empírico

Eu, estudante empírico
Fecho o livro contemplo
Eis o globo, o planisfério terrestre,
O planisfério celeste,
O redondo horizonte, a ilusão dos firmamentos.
E a nossa existência
Eis o compasso, o esquadro, a balança, a pirâmide,
o cone, o cilindro, o cubo, o peso, a forma,
a proporção, as equivalências.
E o nosso itinerário.
Saem das suas caixas os mistérios
Desenrola-se o mapa dos ossos com esses nomes;
O sangue desenha sua floresta-azul;
Cada órgão cumpre um trabalho enigmático:
Estamos repletos de esfinges certeiras.
E o nosso corpo.
E os dinossauros são como carros de triunfo, reduzidos à armação;
e no olho profundo do microscópio a célula se anuncia.
E o nosso destino
O professor escreve no quadro o Alfa e o Ómega.
A luz de Sírius ainda lança escadas em contínua cascata.
E lentamente subo e fecho os olhos
e sonho saber o que não se sabe
simplesmente acordado.
Grande aula, a do silêncio.

Traça a reta e a curva, a quebrada e a sinuosa.
Tudo é preciso. De tudo viverás.
Cuida com exatidão da perpendicular e das paralelas perfeitas.
Com apurado rigor.
Sem esquadro, sem nível, sem fio de prumo, traçarás perspectivas,
Projetarás estruturas.
Número, ritmo, distância, dimensão
Tens os teus olhos, o teu pulso, a tua memória.
Construirás os labirintos impermanentes que sucessivamente habitarás.
Todos os dias estarás refazendo o teu desenho.
Não te fatigues logo. Tens trabalho para toda a vida.
E nem para o teu sepulcro terás a medida certa.
Somos sempre um pouco menos do que pensávamos.
Raramente, um pouco mais.

“Até quando terás, minha alma, esta doçura, este dom de sofrer, este poder de amar, a força de estar sempre – insegura – segura como a flecha que segue a trajetória obscura, fiel ao seu movimento, exata em seu lugar...?”


Cecília Meireles, "Poesia Completa" – vol. 4

Cristina Garcia Rodero

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Tão cedo passa tudo quanto passa!



                                               
Tão cedo passa tudo quanto passa!
Morre tão jovem ante os deuses quanto
           Morre! Tudo é tão pouco!
Nada se sabe, tudo se imagina.
Circunda-te de rosas, ama, bebe
           E cala. O mais é nada.

 3-11-1923

 Ricardo Reis

Marcel Marceau,"Juventude, Maturidade, Velhice e Morte", 1958, fotografia de Henri Dauman

sábado, 8 de dezembro de 2012

O tempo presente e o tempo passado

Barbara Parmet, Meeting On The Shore


















O tempo presente e o tempo passado
Estão ambos talvez presentes no tempo futuro
E o tempo futuro contido no tempo passado.
Se todo tempo é eternamente presente
Todo tempo é irredimível.
O que poderia ter sido é uma abstração
Que permanece, perpétua possibilidade,
Num mundo apenas de especulação.
O que poderia ter sido e o que foi
Convergem para um só fim, que é sempre presente.
Ecoam passos na memória
Ao longo das galerias que não percorremos
Em direção à porta que jamais abrimos
Para o roseiral.
Assim ecoam minhas palavras
Em tua lembrança.
Mas com que fim
Perturbam elas a poeira sobre uma taça de pétalas.
Não sei.
Outros ecos
Se aninham no jardim.
Seguiremos?
Depressa, disse o pássaro, procura-os, procura-os
Na curva do caminho.
Pela primeira porta,
Aberta ao nosso mundo primeiro, aceitaremos
A trapaça do tordo?
Em nosso mundo primeiro,
Lá estavam eles, dignificados e invisíveis,
Movendo-se imponderáveis sobre as folhas mortas,
No calor do outono, através do ar vibrante,
E o pássaro cantou, em resposta
À inaudita música oculta na folhagem.
E um radiante olhar impressentido trespassou o espaço,
porque as rosas
Tinham a aparência de flores contempladas.
Lá estavam eles, como nossos hóspedes, acolhidos e acolhedores.
Assim, caminhamos, lado a lado, em solene postura,
Ao longo da alameda deserta, rumo à cerca de buxos,
Para mergulhar os olhos no tanque agora seco.
Seco o tanque, concreto seco, calcinados bordos,
E o tanque inundado pela água da luz solar,
E os lótus se erguiam, docemente, docemente,
A superfície flamejou no coração da luz,
E eles atrás de nós, refletidos no tanque.
Passou então uma nuvem, e o tanque esvaziou.
Vai, disse o pássaro, porque as folhas estão cheias de crianças,
Maliciosamente escondidas, a reprimir o riso.
Vai, vai, vai, disse o pássaro: o género humano
Não pode suportar tanta realidade.
O tempo passado e o tempo futuro,
O que poderia ter sido e o que foi,
Convergem para um só fim, que é sempre presente. . .

T. S. Eliot, "Four Quartets 1: Burnt Norton"

 

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Que amor sigo?...

Que amor sigo? Que busco? Que desejo?
Que enleo é este vão da fantasia?
Que tive, que perdi, quem me queria?
Quem me faz guerra, contra quem pelejo?

Foi por encantamento o meu desejo,
E por sombra passou minha alegria,
Mostrou-me Amor dormindo o que não via,
E eu ceguei do que vi, pois já não vejo.

Fez à sua medida o pensamento
Aquela estranha e nova fermosura,
E aquele parecer quasi divino.

Ou imaginação, sombra ou figura,
É certo e verdadeiro meu tormento,
Eu morro do que vi, do que imagino.

Francisco Rodrigues Lobo (c.1574?-1621)





sábado, 13 de outubro de 2012

Tomorrow, and tomorrow...

“Tomorrow, and tomorrow, and tomorrow
Creeps in this petty pace from day to day,
To the last syllable of recorded time;
And all our yesterdays have lighted fools
The way to dusty death.
Out, out, brief candle!
Life’s but a walking shadow, a poor player
That struts and frets his hour upon the stage
And then is heard no more. It is a tale
Told by an idiot, full of sound and fury
Signifying nothing.”

William Shakespeare, Macbeth


A. Scarpulla

domingo, 7 de outubro de 2012

O que é a morte?

Charles Nevols


O que é o caminho?
anúncio de partida
escrito em folhas
que o pó desenhou.

O que é o pó?
futuro do corpo.

O que é um espelho?
uma segunda face
um terceiro olho.

O que é uma rosa?
cabeça a decapitar.

O que é a morte?
carro que leva
do útero da mulher
ao útero da terra.

O que é o anoitecer?
discurso de despedida.

O que é a lágrima?
guerra perdida pelo corpo.

O que é o desespero?
descrição da vida na língua da morte.

O que é a coincidência?
fruto na árvore do vento
caindo entre as mãos
sem se saber.

O que é o não sentido?
doença que mais se propaga.

O que é a memória?
casa habitada só
por coisas ausentes.

O que é a poesia?
navios que navegam, sem portos.

O que é a história?
um cego a tocar tambor.

O que é a sorte?
dado
na mão do tempo.

O que é a linha reta?
soma de linhas tortas
invisíveis.

O que é o tempo?
veste que usamos
sem poder tirar.

O que é a melancolia?
anoitecer no espaço do corpo.

O que é o sentido?
início do não sentido
e seu fim.

O que é a velhice?
planta que cresce em duas direções:
a aurora da infância
a noite da morte.

O que é viver?
caminhar sem pausa
rumo ao anoitecer.


trechos do poema "Guia para viajar pelas florestas do sentido", de Adonis

  Durme, Hermosa Donzella (Berceuse Sefardi, Rhodes) by Montserrat Figueras, Jordi Savall, Arianna Savall, Ferran Savall, Pedro Estevan on Grooveshark

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Soneto da Rosa

Mais um ano na estrada percorrida
Vem, como astro matinal, que a adora
Molhar de puras lágrimas de aurora
A morna rosa escura e apetecida.

E da flagrante tepidez sonora
No recesso, como ávida ferida
Guardar o plasma múltiplo da vida
Que a faz materna e plácida, e agora

Rosa geral de sonho e plenitude
Transforma em novas rosas de beleza
Em novas rosas de carnal virtude.

Para que o sonho viva de certeza
Para que o tempo da paixão não mude
Para que se una o verbo à natureza.

Vinicius de Moraes


domingo, 12 de agosto de 2012

The Crunch

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Twenty-eight naked young women...

Twenty-eight naked young women bathed by the shore
Or near the bank of a woodland lake
Twenty-eight girls and all of them comely
Worthy of Mack Sennett’s camera and Florenz Ziegfield’s
Foolish Follies.
They splashed and swam with the wondrous unconsciousness
Of their youth and beauty
In the full spontaneity and summer of the fieshes of
awareness
Heightened, intensified and softened
By the soft and the silk of the waters
Blooded made ready by the energy set afire by the
nakedness of the body,
Electrified: deified: undenied.
A young man of thirty years beholds them from a distance.
He lives in the dungeon of ten million dollars.
He is rich, handsome and empty standing behind the linen curtains
Beholding them.
Which girl does he think most desirable, most beautiful?
They are all equally beautiful and desirable from the gold distance.
For if poverty darkens discrimination and makes
perception too vivid,
The gold of wealth is also a form of blindness.
For has not a Frenchman said, Although this is America…
What he has said is not entirely relevant,
That a naked woman is a proof of the existence of God.
Where is he going?
Is he going to be among them to splash and to laugh with them?
They did not see him although he saw them and was there among them.
He saw them as he would not have seen them had they been conscious
Of him or conscious of men in complete depravation:
This is his enchantment and impoverishment
As he possesses them in gaze only.
…He felt the wood secrecy, he knew the June softness
The warmth surrounding him crackled
Held in by the mansard roof mansion
He glimpsed the shadowy light on last year’s brittle leaves fallen,
Looked over and overlooked, glimpsed by the fall of death,
Winter’s mourning and the May’s renewal.

Delmore Schwartz, “A Dream Of Whitman Paraphrased, Recognized And Made More Vivid By Renoir” 1962
Pierre Puvis de Chavannes, Jovens Raparigas à Beira-Mar, 1879

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Les voleurs d'enfants

Robert Doisneau, La petite fille et l' agent, Paris, 1945

"On peut voler à tout âge;
Le cirque est un cerf-volant.
Sur ses toiles, sur ses cordages,
Volent les voleurs d'enfants.

Volés, voleurs ont des ailes
La nuit derrière les talus,
Où les clameurs maternelles
Ne s'entendent même plus."

excerto de Opéra (1927), Les voleurs d'enfants, de Jean Cocteau

jean cocteau - les voleurs d'enfants

domingo, 8 de julho de 2012

A Torre

A Torre, Thoth Tarot Thoth, de Aleister Crowley

Horas breves de meu contentamento
Nunca me pareceu quando vos tinha,
Que vos visse mudadas tão asinha
Em tão compridos anos de tormento.

As altas tôrres, que fundei no vento,
Levou, em fim, o vento que as sostinha;
Do mal que me ficou a culpa é minha,
Pois sôbre cousas vãs fiz fundamento.

Amor com brandas mostras aparece:
Tudo possível faz, tudo assegura;
Mas logo no melhor desaparece.

Estranho mal! Estranha desventura!
Por um pequeno bem, que desfalece,
Um bem aventurar, que sempre dura.

Luís de Camões

quinta-feira, 28 de junho de 2012

Ícaro

“Never regret thy fall,
O Icarus of the fearless flight
For the greatest tragedy of them all
Is never to feel the burning light.”

Oscar Wilde

Odilon Redon - Ícaro
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