quinta-feira, 28 de julho de 2011

Narciso

"Quando me dizes "Vem", já eu parti
e já estou tão próximo de ti
que sou eu quem me chama e quem te chama
e é o meu amor que em ti me ama.

Se me olhas sou eu que me contemplo
longamente através do teu olhar
e moro em ti e sou eu o lugar
e demoro-me em ti e sou o tempo.

Eu sou talvez aquilo que me falta
(a alma se sou corpo, o corpo se sou alma)
em ti, e afogo-me na tua vida
como na minha imagem desmedida:

Sol, Lua, água, ouro,
horizontalidade, concordância,
indiferente ordem da infância,
união conjugal, morte, repouso.


Manuel António Pina
















A Dama de Shangai, de Orson Wells, 1947

domingo, 24 de julho de 2011

IV - O Imperador

Tarot Fenestra

Gritar

Aqui a acção simplifica-se
Derrubei a paisagem inexplicável da mentira
Derrubei os gestos sem luz e os dias impotentes
Lancei por terra os propósitos lidos e ouvidos
Ponho-me a gritar
Todos falavam demasiado baixo falavam e escreviam
Demasiado baixo

Fiz retroceder os limites do grito

A acção simplifica-se

Porque eu arrebato à morte essa visão da vida
Que lhe destinava um lugar perante mim

Com um grito

Tantas coisas desapareceram
Que nunca mais voltará a desaparecer
Nada do que merece viver

Estou perfeitamente seguro agora que o Verão
Canta debaixo das portas frias
Sob armaduras opostas
Ardem no meu coração as estações
As estações dos homens os seus astros
Trémulos de tão semelhantes serem

E o meu grito nu sobe um degrau
Da escadaria imensa da alegria

E esse fogo nu que me pesa
Torna a minha força suave e dura

Eis aqui a amadurecer um fruto
Ardendo de frio orvalhado de suor
Eis aqui o lugar generoso
Onde só dormem os que sonham
O tempo está bom gritemos com mais força
Para que os sonhadores durmam melhor
Envoltos em palavras
Que põem o bom tempo nos meus olhos

Estou seguro de que a todo o momento
Filha e avó dos meus amores
Da minha esperança
A felicidade jorra do meu grito

Para a mais alta busca
Um grito de que o meu seja o eco.


Paul Éluard, in "Algumas das Palavras"
Tradução de António Ramos Rosa

sábado, 23 de julho de 2011

A Morte do Cisne



Vera Karalli no filme russo Umirayushchii Lebed realizado em 1917 por Evgeni Bauer. A música é de Camille Saint-Saëns. A actriz-bailarina esteve envolvida na conspiração para assassinar Rasputine.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Tristis est anima mea

Tornai-me a aparecer, entes imaginários,
que me enchíeis outrora os olhos visionários!
Poder-vos-ei fixar?... Tenho inda coração
capaz de se render à vossa sedução?...
Chegam... que densa turba! Envolve-me... Não posso
furtar-me ao seu triunfo. Eis-me, Visões, sou vosso.
Vai-se-me em névoa o mundo. Emanações sutis
que exalais, vem tornar-me aos anos juvenis.
Que imagens que trazeis de dias tão risonhos!...
Caras sombras! sois vós? aéreas como em sonhos?
Como recordação de lenda já perdida,
volve o amor, a amizade, e reassumem vida;
torna a dor a doer. Oh vida! oh labirinto!
de novo o mesmo sois. Já renascer me sinto.
Cá ’stão os bons d’outrora, entes que já gozaram
horas de ouro, e também... como elas se escoaram.
Não me hão-de ouvir agora os mesmos, bem o sei,
para quem noutro tempo os versos meus cantei.
Sumiu-se, aniquilou-se aquela amiga turba,
que nem com som mortiço os ecos já perturba.
Vibra meu canto agora a ignota multidão,
cujo aplauso, ai de mim! me aperta o coração;
e os a quem meu cantar outrora foi jucundo,
erram, se inda alguns há, dispersos pelo mundo.
Ai, plácida mansão, de espíritos morada!
revive na saudade, há tanto descorada!
Começa em vagos sons meu estro a palpitar,
qual de uma harpa eólia o triste delirar...
Já sinto estremeções; o pranto segue ao pranto,
e o duro coração se abranda por encanto.
O que foi, torna a ser. O que é, perde existência.
O palpável é nada. O nada assume essência.

Goethe, in Fausto (prólogo)

domingo, 10 de julho de 2011

"La Passacaglia della Vita"




Oh come t'inganni
se pensi che gl'anni
non hann' da finire,
bisogna morire.

È un sogno la vita
che par sì gradita,
è breve gioire,
bisogna morire.
Non val medicina,
non giova la China,
non si può guarire,
bisogna morire.

Non vaglion sberate,
minarie, bravate
che caglia l'ardire,
bisogna morire.
Dottrina che giova,
parola non trova
Che plachi l'ardire,
bisogna morire.

Non si trova modo
di scoglier 'sto nodo,
non val il fuggire,
bisogna morire.
Commun'è statuto,
non vale l'astuto
'sto colpo schermire,
bisogna morire.

La morte crudele
a tutti è infedele,
ogn'uno svergogna,
morire bisogna.
È pur ò pazzia
o gran frenesia,
par dirsi menzogna,
morire bisogna.

Si more cantando,
si more sonando
la Cetra, o Sampogna,
morire bisogna.
Si muore danzando,
bevendo, mangiando;
con quella carogna
morire bisogna.

I Giovani, i putti
e gl'Huomini tutti
s'hann'a incenerire,
bisogna morire.
I sani, gl'infermi,
i bravi, gl'inermi
tutt'hann'a finire,
bisogna morire.

E quando che meno
ti pensi, nel seno
ti vien a finire,
bisogna morire.
Se tu non vi pensi
hai persi li sensi,
sei morto e puoi dire:
bisogna morire.

(Tradução em inglês):

Oh how wrong you are
to think that the years
will never end.
We must die.

Life is a dream,
that seams so sweet,
but joy is all too brief.
We must die.
Of no avail is medicine,
of no use is quinine,
we cannot be cured.
We must die.

Worthless are lamentations,
threats, bravado
produced by our courage.
We must die.
No learned doctrine
can find the words
to calm this boldness
We must die.

There is no means
to untie this knot,
it is useless to flee.
We must die.
It is the same for everyone,
a wily man cannot
shield himself from the blow,
We must die.

Cruel Death
is unfaithful to all,
and shames everyone.
Die we must.
And yet, o madness
o ravings,
it seems like lying to oneself.
Die we must.

We die singing,
we die playing
the cittern, the bagpipe, yet
die we must.
We die dancing,
drinking, eating;
with this carrion,
die we must.

Youths, children,
and all men
must end in dust.
We must die.
The healthy, the sick,
the brave, the defenceless,
must all make an end,
We must die.
And when you are least
thinking of it, in your breath,
all comes to an end,
We must die.
If you do not think of this,
you have lost your senses,
you are dead and you can say:
We must die.

sábado, 9 de julho de 2011

Máscaras III

Albert Lynch, The Mask Ball

Wladyslaw T. Benda, 1922

Wladyslaw T. Benda, 1922

Ray Donley

Jean Bailly

Joseph Desire Court, The Mask

Raphael Kirchner

Darnier Rappel

Horst P. Horst - Gene Tierney 1940

Condessa de Castiglione 1865

Manasse

Man Ray

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Sonho de uma Noite de Verão


Midsummer Night's Dream, de Max Reinhardt, 1935

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Vanity

All is vanity, nothing is fair.
William Makepeace Thackeray, Vanity Fair

Frank Cadogan Cowper, Vanity, 1907

terça-feira, 5 de julho de 2011

Bransle de village


Poème Harmonique - dir. Vincent Dumestre

sexta-feira, 1 de julho de 2011

A Sereia

por Alfred Lord Tennyson
(1830)

I.
Who would be
A mermaid fair,
Singing alone,
Combing her hair
Under the sea,
In a golden curl
With a comb of pearl,
On a throne?



II.
I would be a mermaid fair;
I would sing to myself the whole of the day;
With a comb of pearl I would comb my hair;
And still as I comb’d I would sing and say,
“Who is it loves me? who loves not me?”
I would comb my hair till my ringlets would fall,
Low adown, low adown,
From under my starry sea-bud crown
Low adown and around,
And I should look like a fountain of gold
Springing alone
With a shrill inner sound,
Over the throne
In the midst of the hall;
Till that great sea-snake under the sea
From his coiled sleeps in the central deeps
Would slowly trail himself sevenfold
Round the hall where I sate, and look in at the gate
With his large calm eyes for the love of me.
And all the mermen under the sea
Would feel their immortality
Die in their hearts for the love of me.



III.
But at night I would wander away, away,
I would fling on each side my low-flowing locks,
And lightly vault from the throne and play
With the mermen in and out of the rocks;
We would run to and fro, and hide and seek,
On the broad sea-wolds in the crimson shells,
Whose silvery spikes are nighest the sea.
But if any came near I would call, and shriek,
And adown the steep like a wave I would leap
From the diamond-ledges that jut from the dells;
For I would not be kiss’d by all who would list,
Of the bold merry mermen under the sea;
They would sue me, and woo me, and flatter me,
In the purple twilights under the sea;
But the king of them all would carry me,
Woo me, and win me, and marry me,
In the branching jaspers under the sea;
Then all the dry pied things that be
In the hueless mosses under the sea
Would curl round my silver feet silently,
All looking up for the love of me.
And if I should carol aloud, from aloft
All things that are forked, and horned, and soft
Would lean out from the hollow sphere of the sea,
All looking down for the love of me.

Edward John Poynter, The Siren
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